segunda-feira, 6 de outubro de 2008

A Relatividade

Fico muito deprimido por só agora aos 71 anos de idade ter entendido como afinal era tão fácil deixar de ser mal alimentado, mal educado, alcoolizado, sebento, desastrado, presunçoso, arrogante, ignorante, orgulhoso, vaidoso, imodesto, emproado, pedante, convencido, afectado, empertigado, enfatuado, soberbo, presumido, snob, altaneiro, altivo, desdenhoso, sobranceiro, fanfarrão, bazofiador, emproado, pimpão, impostor, chamborgas, farronqueiro, bugalhão, gabarolas, jactancioso, ufano, chançudo, insolente, petulante, magestoso, intolerante, inflexível, rígido e fanático.
Bastava-me ter embarcado num “super constelation” para as Américas e logo ao poisar o pé em solo ameríndio passaria a ficar bem alimentado segundo a escola Macdonaldoidana, bem-educado, abstémio, asseado, hábil, modesto, moderado e… por aí fora.
O erro foi-me induzido, embora involuntariamente, pelo Pranto. O Pranto era um vizinho que trabalhou nos EUA no tempo em que os índios ainda criavam alguns problemas aos colonizadores. Já velho, regressou a Portugal e vivia modestamente dos rendimentos. Contava inverosímeis estórias de Cowboys que deliciavam a criançada. Falava das dólares com muita frequência como se fosse o elo de ligação com o seu passado de aventura, e não largava por nada o típico chapéu à Gary Cooper. A gente pagava-lhe em géneros. Lia-lhe as notícias do jornal diário pois era analfabeto. Com ele aprendemos a dizer camone, charape, teicarisi e gudenaite, absolutamente suficientes para representar os diálogos nas nossas brincadeiras do farueste, à tardinha, depois das aulas.
Não fosse ter tirado as medidas ao Novo Mundo pela bitola do Pranto e talvez eu não fosse a besta que sou hoje.
O Destino marca a hora!
Onde é que eu já ouvi isto?
Ah, pois, canta Tony de Matos!
A.M.

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