quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Loucura Nacional

Pelo que ouvia contar ao meu avô, mas principalmente pela leitura de autores do início do século passado, a honra era uma coisa que se preservava e regava todos os dias para não fenecer.
Havia quem se suicidasse se perdesse o seu bom-nome na praça pública e era vulgar o ofendido procurar o agressor para lhe arrefinfar umas bengaladas nos costados. Houve mesmo um escritor que foi de propósito de Lisboa ao Porto para usar a sua bengala num colega que tinha tecido algumas considerações a seu respeito que o revoltaram.

Há um conto, "A confissão", de Miguel Torga, em que o personagem é acusado de ter morto um homem. Preso e torturado vê-se obrigado a fugir do país. Regressa à sua aldeia muitos anos mais tarde precisamente no dia em que tinha morrido um amigo de infância. De modo casual e natural (façam o favor de ler) soube que o morto é que tinha sido o assassino, pelo que se dirigiu à casa mortuária. Transcrevo a espectacular parte final:
“O cadáver jazia ainda sobre a cama, já vestido, à espera do caixão”. A passos lentos aproximou-se e fitou durante alguns momentos a figura hirta e mirrada do defunto. De repente, num ímpeto, deitou-lhe as mãos às abas do casaco, ergueu-o e rouquejou fora de si:
- Estás morto, é o que te vale. Mas mesmo assim não vais deste mundo sem duas bofetadas na cara, covarde! E deu-lhas.

”Os tempos são outros. Muita coisa mudou. Talvez fosse um bom exercício tentar descobrir as razões porque hoje, com o maior à vontade, se insultam as pessoas, acusando-as de tudo e mais alguma coisa, sem o mais pequeno fundamento e pelas razões mais mesquinhas. Talvez, então, conseguíssemos compreender o que dá voz a Alberto João Jardim e silencia Cavaco Silva.

Será porque o uso de bengala está fora de moda?

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