sábado, 12 de janeiro de 2013

Falência do sistema à vista


Sr. Primeiro-ministro,
Não perco uma intervenção sua. Se não for em tempo real será em diferido. O único objetivo que me move é saber onde é que meu orçamento vai sofrer mais um impacto negativo, para imediatamente reformular, ou se preferir refundar, o meu orçamento familiar de modo a conseguir viver sem apresentar um saldo negativo no fim do mês. Nesse sentido aceito sugestões de familiares e amigos para reduzir a despesa do agregado mas sem nunca perder a noção de que os bens essenciais devem ser preservados. Não vou cortar no pão para comprar tabaco. Não vou ao cinema para poder pagar a taxa moderadora de uma consulta médica. Continuo ainda a abastecer-me de leite mas tive que mandar deitar meias solas nos sapatos em vez de comprar uns novos. Deixei de comprar o jornal diário para poder deliciar-me com a bica matinal. Não houve prendas no Natal nem festejei o ano novo para poder comer um bife de vez em quando, do pojadouro porque é mais barato. Tenho o automóvel parado à porta há mais de 1 mês, meio atestado, porque com gente doente em casa nunca se sabe quando pode acontecer uma emergência. Enfim, faço o que posso para manter o bote a flutuar.

Vossa Excelência comanda um Transatlântico e os passageiros estão a viver pior do que a marinhagem. Qualquer dia, se não aparecer um iceberg pelo caminho, não há passageiros a bordo, se, atendendo ao seu pedido, se atirarem pela borda fora.
Em quase todas as suas intervenções, se nos esquecermos das que fez na campanha eleitoral, desculpa-se com a governação anterior (por acaso logo que tomou posse ouvi-o dizer que nunca iria usar essa desculpa) e ultimamente tem-se referido à necessidade de convergirmos com os outros países em áreas como as despesas da saúde, a diminuição dos dias de indemnização por despedimento, à redução de pensões, ao número exagerado de funcionários públicos, de professores, etc.

Qualquer área em que pretenda impor mais austeridade lá vem pendurada na sua intervenção a explicação de que devemos convergir com a média europeia.
Isto é falacioso.
Quando alguém emigra para um país não deve preocupar-se apenas com o vencimento que vai ter, o qual é sensivelmente maior em qualquer país da EU incluindo a Grécia. É mais sensato saber quantas horas tem de trabalhar para poder comprar um frango, 1k de pão, de feijão, uma bilha de gás, ou o preço da viagem para o emprego, enfim, tudo aquilo que deve fazer parte dos gastos de qualquer família. Se nós temos o salário mínimo mais baixo da União, Vossa Excelência não deve procurar nivelar pelos outros, apenas aquilo que lhe interessa para justificar um aumento de despesa ou um corte no rendimento de qualquer família. Deve atender também à relação do preço dos bens que é preciso comprar para se viver com alguma dignidade e o seu próprio salário, rendimento ou pensão. O Sr. Primeiro Ministro acha que uma pessoa a viver com 485 euros na Alemanha poderia sobreviver? Só se fosse a bolachas d água e sal… e racionadas.

Descarregar no governo anterior a culpa da situação em que nos encontramos é uma fórmula estafada que os dois partidos que se têm alternado no governo têm usado depois das primeiras legislativas. Se nos primeiros anos se desculparam com as governações anteriores de Vasco Gonçalves, passado alguns anos passou a ser ridículo fazê-lo e desde então atacam-se mutuamente.
Se é certo que os partidos se distinguem por possuir ideias políticas diferentes, a luta pelo poder não justifica que não haja acordos pontuais para se conseguir o desenvolvimento sustentado do país e a estabilidade e qualidade de vida dos portugueses.

Apenas um exemplo: Vai fazer 36 anos no próximo dia 25 de Abril que se realizaram as primeiras eleições legislativas. Passados 36 anos (tempo de serviço para a reforma) os funcionários públicos de então estarão todos mortos ou reformados.
Se existia, em comparação com outros países da Europa um peso excessivo de funcionários públicos no nosso, não teria sido difícil fazer um acordo sobre a forma de reduzir esse peso de uma maneira calma e ponderada, equilibrando a sua saída para a reforma com o uso dos meios informáticos já então disponíveis.

Uma coisa que podia ter sido feita sem dor ou sobressaltos é agora feita em lotes de 40 mil despedimentos.

 Sr. Primeiro-ministro, se o sistema de partidos está hoje desacreditado ao ponto de se equacionar uma outra forma de governação, talvez mais representativa ou mesmo nada representativa como a que havia quando Vossa Excelência tinha 10 anos de idade e ainda jogava ao berlinde, a quem vão deitar as culpas os dois alternantes no poder?

Sem comentários: