quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Meu diário, meu amor!

25 Agosto de 2005

Há muita gente que logo de manhã compra ou manda comprar todos os jornais do dia apenas para consultar assuntos específicos relacionados com a sua actividade. Pouco tempo depois já estão no caixote do lixo.
Mas a grande maioria de leitores são aqueles que, contaminados por um estranho vírus afectivo, compram todos os dias apenas um determinado jornal, que devoram página a página, letra a letra, como se, dado o seu preço, até o tutano lhe devessem chupar. Às vezes deixam uma coluna para saborearem mais tarde, talvez ao serão. Entram em vertiginosa órbita giratória quando dão conta que o jornal entretanto desapareceu porque serviu para forrar o caixote do lixo.
- Quem foi a besta que já me fez as palavras cruzadas? – Dizem quando se preparavam para aquele ritual diário e dão conta que alguém, lá em casa, se lhe adiantou.
Tomados por avassaladora paixão vão ter mais dificuldade em divorciar-se dele do que da própria mulher.

Eu pertenço a esta classe. Estou enforcado há pouco tempo com um, e ainda sinto saudades do meu primeiro, o qual tive que mandar para o brejo por causa de uns colunistas que me começaram a chamar nomes. A mim e a mais uns quantos como eu.
Já cheguei à conclusão que o desejo de ter um jornal só com colunistas que rimem com as nossas ideias para além de ser uma utopia era um grande aborrecimento. É bom lermos quem gostamos, mas também faz um bem danado a gente sentir-se espicaçado pelos comentários adversos de outros que julgamos odiar. Afinal são os nossos inimigos de estimação.

Por exemplo:
No dia em que tiver programado cuidar da minha colecção de selos não devo ler Helena de Matos. Devo, contudo, lê-la no dia reservado para cavar o quintal, ou ainda melhor se tiver um muro para deitar abaixo com uma marreta. E a coisa deve ficar por aqui.
Não convém comentá-la, como fez a “pobre” Maria João Seixas, pois logo pincham em cima os verdadeiros “amantes” de Helena, que, anónimos como eu, aproveitam para, esquecendo o objectivo, desancarem tudo o que tenha o mais leve tom róseo.

Foi o que fez um leitor no dia 25, em que para além colocar em dúvida a carteira profissional de Maria João Seixas como jornalista, tece as seguintes considerações a respeito da “adolescência tardia”:
“O chamado espírito jovem é geralmente lamentável, e tanto mais lamentável quanto mais velho for o corpo em que se manifesta. Um velho com o tal espírito jovem é uma coisa triste porque significa (contrariamente ao que é habitual dizer-se) que não atingiu a sabedoria, a abertura, a tolerância, o apaziguamento, a consciência crítica, o sentido do ridículo, a noção do essencial, a relativização dos acontecimentos, enfim, a visão larga da vida que a idade vai trazendo.”

E assim, inesperadamente, por acaso num dia 25, embora de Agosto, sou informado que ter um espírito jovem é uma desvantagem para compreender o mundo em constante mutação, os novos desafios, as recentes descobertas. Aterrado com esta acusação dá-me vontade de afivelar a máscara da sisudez, do sorumbatismo e da misantropia. António Macambúzio Mata, devo passar a assinar. Nessa altura passarei a ter uma figura distinta, e a ser complacente, tranquilo, inteligente, magnânimo, enfim um sábio que até um colaço não desdenhará convidar para a sua mesa

E os anos perdidos na luta para manter uma mente jovem? Tanto tempo perdido, meu Deus! Quando tinha sido tão fácil deixar a mente envelhecer ao ritmo celular, que desacerto fui eu procurar para, afinal, ser agora desclassificado?

Afinal sempre estive enganado. Eu pensava que velho ridículo era aquele que queria aparentar um ar jovem, pintava o cabelo e o bigode quando embranqueciam, e na falta dele puxavam a melena para o cocuruto ou usavam peruca. Faziam plástica para atenuar as gelhas e eliminar as plicas e mentiam quanto á sua idade.
Porquê? Porque possuíam a vã ilusão que podiam enganar o Tempo e ganhar vantagem em algumas aventuras terráqueas.

Ficamos então a saber que tudo se centra na cachimónia. Aquela parte dos neurónios que nunca é solicitada durante a nossa vida, deve ficar assim em descanso até que uma pasada de terra, ou a chama do crematório lhe tracem o destino final. Devemos usar os velhos neurónios, sensibilizados com as antigas imagens, onde estão fixadas as velhas regras do comportamento, sendo completamente proibido fazer “downloads” de actualização. Os nossos ancestrais ascendentes vão gostar!

Por isso eu não vou divorciar-me do meu querido jornal diário.

A propósito onde é que o arrumei? Tenho que ler melhor aquela história do Pat Roberson, líder religioso cristão, que recomenda que os EUA procedam ao assassinato de Hugo Chávez. Quero ver se Bush diz alguma coisa sobre o assunto.
A.M

1 comentário:

mulher lua disse...

Ó velho Mata, cada vez mais jovem, esta crónica está do carago! ah ah ah

Veijios e até sábado