sexta-feira, 13 de julho de 2018



A vigarice
                                                                                                              A mentira roda meio mundo
                                                                                                            antes da verdade ter tido tempo
                                                                                                                     de colocar as calças
                                                                                                                     (Winston Churchill)

 Antes de tudo o que possam dizer, quero confessar que o meu habitat é no meio dos eletrões e por isso, se me meto em comentários do tipo deste que agora inicio, só estão autorizados a dizer: Porque te metes tu, sapateiro a tocar rabecão?
Vigarice deriva de vigário que por sua vez decorre do latim vicariu. Em português vigário é aquele que substitui outro, mas no Brasil além de ser o pároco em muitas freguesias também é espertalhão, finório.
O facto de haver duas origens diferentes para legitimar a origem do termo “conto do vigário” deixam-me embaraçado sem poder concluir quem é que contribuiu de modo definitivo para se chegar à vigarice. No Brasil contam a disputa dos vigários de duas paróquias, Pilar e Conceição, por uma imagem de Nossa Senhora. Um dos vigários teria proposto que a santa fosse amarrada a um burro que seria solto entre as duas igrejas e a paróquia para onde o burro se dirigisse ficaria com a santa. Só muito mais tarde se descobriu que o burro era do vigário dessa igreja.
Por cá, nesta terra que nunca mais ganha juízo, e como não pode emigrar continua à beira mar plantada, a história é outra. Quem a conta é nem mais nem menos o nosso estimado Fernando Pessoa, amigo de Abel Pereira da Fonseca, que talvez sem saber contribuiu para os extraordinários devaneios poéticos de Pessoa. Um lavrador ribatejano, Manuel Peres Vigário é abordado por um fabricante de notas falsas…
O livrinho custa à roda de 5 euros. Se quiseram eu conto a história. Basta pedirem.
O que interessa ao caso é que Vigário deu em Vigarice, ficando nós sem saber a verdadeira origem.
Vigarice, pois!
Passaram já muitos anos sobre a data de qualquer das origens descritas para a ligação “vigário/vigarista” mas uma coisa é certa, a evolução tecnológica, a democracia que determina que é proibido proibir seja o que for, mesmo que seja para dar cabo da humanidade, o espírito globalizante que foi desencadeado como se fosse uma solução para as desigualdades, também deram origem à transfiguração da vigarice.
Hoje com as novas roupagens, que novas tecnologias favorecem, a vigarice surge tão camuflada que só a invenção de um “vigariçómetro” nos pode ajudar se por acaso o inventor não for um vigarista ao serviço do grémio respetivo. Muita atenção, pois todo o cuidado é pouco. Lembrem-se de uma coisa importante, hoje já não há contos…há euros.  
A vigarice está no anúncio de uma pomada, duma frigideira, duma casa, dum medicamento, dum mero pedido de ajuda, nas letras muito pequeninas dos contratos de eletricidade, de telefone ou televisão, do pedinte que se faz de pobre, do são que se faz de doente, do rico que declara rendimento mínimo, do político que faz promessas que sabe que não vai cumprir.
Pelo caminho que isto leva, proponho uma nova disciplina escolar: aprendizagem de técnicas defensivas contra os vigaristas.

terça-feira, 10 de julho de 2018

Janeiro/2005
"Penduro aqui, para que não se perca.

A Batalha de Aljezur
Existem muitas pessoas que passados tantos anos ainda enaltecem Salazar por ter evitado que participássemos na segunda grande guerra mundial quando em setembro de 1939, anunciou a nossa neutralidade. O que não se entende é por que razão, essas mesmas pessoas, defendem hoje com tanta sanha a nossa participação ao lado da coligação na guerra contra o Iraque.
Se agora devemos entrar na guerra contra o terrorismo, não devíamos ter entrado na guerra contra o nazismo?
Quando Franco e Hitler se encontraram em Hendaia em 1940 e acordaram sobre o apoio espanhol, logo que existissem condições logísticas para um ataque a Gibraltar ou um embarque aliado em Portugal, Salazar entendeu declarar-se neutro para passarmos ao lado do conflito. E passou.
E a neutralidade? Existiu ela?
Nas andanças que faço pelo país durante as férias ganhei o hábito de visitar os centros culturais e as bibliotecas que um pouco por todo o lado as autarquias tiveram o bom senso de instalar e desenvolver. Para quem, como eu, recorda as poucas e mal apetrechadas bibliotecas itinerantes da Gulbenkian, que nos anos 50 do século passado andavam de terra em terra pelo país, contribuindo para, apesar de devidamente filtradas pela censura, quebrar um pouco o isolamento de que quem vivia no interior, não pode deixar de reconhecer que neste aspeto algo mudou para melhor.
Porque muitas autarquias incentivam e ajudam os “filhos da terra”  a publicar obras sobre temas que digam respeito à região, tive a oportunidade de adquirir um livro que se chama “A Batalha de Aljezur”.
O autor, José Augusto Rodrigues, fez uma longa e cuidadosa investigação para executar este trabalho, do qual apenas quero referir o seguinte:
Ali, é relatado um episódio da Segunda Grande Guerra que se passou ao largo da costa entre Sines e S. Vicente. Um comboio marítimo aliado, de 25 barcos, que se deslocava para o norte de África, foi atacado por quatro bombardeiros Condor, oriundos da base Bordéus- Mérignac no sul da França (já ocupada). Dois caças Spitfires que escoltavam o referido comboio perseguiram os bombardeiros, conseguiram abater um deles, que incendiando-se, veio a despenhar-se na falésia junto à Ponte da Atalaia.
O que agora convém sublinhar é o seguinte:
Os comboios referidos eram perfeitamente visíveis de terra quando dobravam o Cabo de S. Vicente. O chefe do farol, Francisco Faria Regêncio, 1º sargento condutor de máquinas, comunicava através de radioemissor para a legação germânica em Lisboa, que por sua vez alertava para a base alemã no sul de França. Em pouco mais de uma hora os bombardeiros alemães apareciam sobre a presa.
Os corpos dos aviadores alemães mortos no acidente foram retirados pela guarda-fiscal e na noite de 11 para 12 tiveram direito a velório com guarda de honra da Legião Portuguesa. No funeral estiveram presentes individualidades portuguesas e alemãs, o exército português fez-se representar por dois pelotões do aquartelamento de Lagos, que executaram as salvas em honra dos falecidos. Durante o cortejo fúnebre as urnas foram levadas aos ombros por membros da célula local da Legião Portuguesa.
Inúmeras fotografias da cerimónia mostram os participantes fazendo a famosa e caraterística saudação
Mais tarde, com a devida autorização do Ministério do Interior, as autoridade alemãs distribuíram medalhas e condecorações (Cruz de Mérito da Águia Alemã, destinada a condecorar quem se tivesse distinguido em defesa da  Alemanha) a alguns elementos da Legião Portuguesa.
Entretanto Salazar, dormia a sesta e não tinha dado por nada.
Neutralidade?
PUFF!