sexta-feira, 30 de setembro de 2011

O camelo e o buraco da agulha

Esta manhã enquanto o Jorge me serve a bica matinal no café da esquina, onde diariamente e à mesma hora vou desde que me reformei, comunica-me:  
- O Tino foi preso!
- Já li a notícia – respondo eu
- Amanhã já está na rua – acrescento.
- Não acredito – retruca ele.
- Aposto as bicas do mês – proponho eu.
- OK! Combinado.
Hoje, à hora do almoço ainda não se sabia muito bem se o Tino era solto ou não.
Li alguns comentários e, como de costume, aparecem alguns a regozijar-se com o facto de, finalmente, prenderem um personagem público, muito conceituado, que até foi reeleito depois de ter sido condenado a 8 anos de prisão.
Ingénuos!
Isto, quando muito, foi a expressão de uma Justiça, que envergonhada, quis mostrar trabalho e independência.
Então ainda não viram que quem tem caroço (a maior parte adquirido através do desfalque do erário público) pode sustentar durante anos uma equipa de advogados que, conhece todas as portas e buracos duma lei feita à medida da gente rica e influente e que de recurso em recurso vai mantendo em liberdade, os condenados em primeira instância.
Talvez, a maior parte das pessoas julgasse que depois do recurso para o Tribunal Constitucional, terminaria o processo. Quem ia pensar que outro recurso para o mesmo tribunal ia permitir mais um adiamento para o cumprimento da pena, que começando por ser de oito anos já vai só em dois? Poderá ainda haver um terceiro?
Talvez não haja, digo eu que não percebo patavina destas coisas.
Será que não há ainda o Tribunal Internacional?
O Estado que se ponha a pau pois talvez tenhamos que pagar ao condenado choruda indemnização.
Que pena que eu tenho de não ter apostado com a minha mulher a lavagem da loiça durante oito dias quando há dias se soube quem era o principal suspeito do caso “Feteira”.
Eu disse logo:
- Se ele vir que há perigo já cavou para longe!
- Foge agora – respondeu ela.
Parece que ainda não fugiu mas dizem que está em parte incerta.
Vai uma apostinha?
A.M.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O Crime de Serrazes

De facto, não tenho a mais pequena dúvida de que, com o peso dos anos, aumenta a atenção que damos a factos que, ou nos passavam despercebidos ou simplesmente desvalorizávamos.


Creio que isto se deve a três factores principais.
1º - A importância que atribuímos ao “tempo que nos resta para viver” e que, imparavelmente, nos conduz para um estádio de alerta muito mais apurado e interessado.
2º - O conhecimento, e apesar de tudo, também o saber, acumulados durante décadas.
3º - E não menos importante: o interesse em procurar ainda, apesar da idade, uma verdade que nos escapa, mas que perseguimos ainda, como se procurássemos arranjar um fecho dourado e digno para o nosso fim.
Deste modo, não há um único dia em que numa conversa com familiares ou amigos, numa notícia da imprensa falada ou escrita, às vezes até num sonho, surjam as molas impulsoras que nos levam a reviver, compreender e relacionar com a actualidade, factos passados há muitos anos.
Tendo iniciado um trabalho para uma amiga de família que muito estimamos e que consiste em copiar um livro antigo, editado em 1922, sobre um crime muito falado na época e referenciado como “Crime de Serrazes”, com a finalidade de fazer uma pequena edição familiar, fui confrontado com factos que buliram com a minha imaginação e me levaram a tentar compreender os valores e comportamentos daquela época quando comparados com aqueles com que hoje nos defrontamos.
Como é evidente não vou maçar ninguém com a pesada retórica dos julgamentos, da acusação pública e privada, da defesa e ainda com as repetições exaustivas das testemunhas. Só pretendo referenciar um outro aspecto que despertou o meu interesse.


Por exemplo:
O segundo julgamento deste crime, depois do primeiro feito S. Pedro do Sul, realizou-se em Coimbra. Dado o grande impacto que teve a nível nacional, com o aproveitamento exploratório da imprensa, (de que alguns jornais são hoje dignos representantes) geraram-se alguns conflitos, que a certa altura envolveram a Universidade de Coimbra acusando-a de favorecer ou apoiar uma das partes em litígio.
Geraram-se no interior da universidade alguns movimentos que através de declarações para a imprensa ou mesmo para o ministro da justiça, procuravam justificar e provar a neutralidade de Universidade neste caso.
Transcrevo a declaração que foi enviada para o Ministro da Justiça à época.
"Tendo-se praticado em Coimbra, depois do julgamento do crime de Serrazes, factos que, representando a subversão dos mais elementares princípios da ordem, e de desacato às decisões judiciais, constituem ao mesmo tempo uma ofensa à dignidade de homens que cumpriram honradamente um dever de consciência, os abaixo assinados exprimem o seu protesto contra esses excessos, sem que isto signifique de modo algum uma censura ao gesto daqueles que tenham assinado o pedido de indulto, movidos unicamente por um sentimento de piedade."


Coimbra, 30 de março de 1922


Eugénio de Castro
Mendes dos Remédios
Oliveira Guimarães
Gonçalves Cerejeira
Guilherme Moreira
Álvaro Villela
Alberto dos Reis
Paulo Merêa
Fésas Vital
Magalhães Collaço
Oliveira Salazar
Beleza dos Santos
Manuel Rodrigues
Cabral Moncada
Mário de Figueiredo
Adelino Vieira de Campos
Serras e Silva
Elísio de Moura
Álvaro de Mattos
Novaes de Sousa
Souto Rodrigues
Bernardo Ayres
Euzebio Tamagnini
Egas Pinto Basto
Luiz Carrisso
Pereira Dias


Lendo os nomes dos declarantes, deu-me na veneta investigá-los, agora que nem é preciso ir à Torre do Tombo, pois ela vem até nós. Se tiverdes o mesmo interesse verificareis que uma grande parte dos assinantes vieram a ser membros dos governos de Salazar como responsáveis em diversos ministérios e outros, que pela idade deviam ser professores, eram apaniguados de João Franco e tinham servido a monarquia até à implantação da república. Creio que Gonçalves Cerejeira era professor de teologia da Universidade, disciplina que mais tarde acabou por ser extinta.


Ora bem! Afinal o que mudou neste país?
Creio que foram só as moscas!
Amen!
A.M.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Desisto! (II)

Hoje apetecia-me dizer mal de alguém: agarrar num gajo qualquer e esfacelar-lhe a prosápia e o ego até nem sobrar um pedacinho maior do que aqueles que saem duma 1,2,3 a trabalhar 10 segundos.
Pensei no Alberto, porque está na moda e porque acha que a gente do ”contenente”  é que se endividou e os portugueses da Madeira não têm nada com isso. Ele afirma que lhe está a ser movida uma perseguição política por forças conluiadas da Maçonaria, dos comunistas, dos socialistas, da CIA e do KGB.
Mas, como estou a planear ir passar o fim do ano à Madeira, receio que o Alberto não me deixe desembarcar. Além disso ele tem obra feita e pelo tom de voz que usa nas suas contestações não arrecadou nada para si próprio. Consta, nas conversas à boca pequena, que está falido. 
Depois, pensei nos arguidos do antiquíssimo caso “Casa Pia”, qualquer deles, mas achei que eles são menos culpados do que a própria Justiça que anda para aí num desatino a ver se arranja alguém que lhe afira a balança. Tirei daí o sentido.
Também considerei o nosso PM como vítima possível da minha maledicência. Mas depois de pesar muito bem a justeza da crítica, acabei por achar que o verdadeiro culpado da nossa mísera situação é o Troica, que eu não conheço, mas não deixarei de investigar na Net para lhe conhecer o perfil. Ele que se cuide!
Pois é, podia muito bem cilindrar o Sócrates. Até nem seria desajustado, dado que toda agente acha que ele é que é o verdadeiro culpado do défice que nos estrangula. Certamente até seria aplaudido de pé. O ex-primeiro deve estar escondido aí em qualquer lado, dizem que em Paris mas eu acho que ele está com os lamas no Tibet a meditar profundamente e só aguarda que os portugueses comecem todos a gritar: -Volta, Sócrates, estás perdoado! Também desisti.
Diversos nomes passaram no ecrã da minha cachimónia: O Esaltino, a Fátima, o Valentim, até mesmo o Godinho Lopes por causa daquela coisa dos transatlânticos alugados para a expo 98, ou porque não do “Barão Vermelho” que escondido naquela brumosa Londres não deixa de cumprir diariamente o seu Five o’clock tea.
Estava eu nisto quando recebo um email a pedir para assinar uma petição contra a taxa de 1,5 euros que os bancos querem lançar sobre cada levantamento no multibanco. Só não fiquei varado, ali mesmo, porque estava sozinho em casa e não havia ninguém para chamar o 112 para me oxigenar a pulmoeira.  À hora do almoço avisei a minha mulher que tínhamos de voltar aos colchões de palha de milho para esconder as nossas economias pois aqueles tipos dos bancos querem-nos sonegar alguma parte, para terem, pelo menos, os mesmos lucros que no mesmo período do ano passado.
Ainda tentava restabelecer-me de mais esta desagradável e onerosa notícia quando no telejornal  vejo um gajo montado numa bicicleta a pedalar sub-aquaticamente dentro de uma piscina. Com a garrafa de oxigénio às costas pedalou até bater o recorde do Guiness que era de 3 quilómetros e tal.
Boa! – disse eu.
E não me lembro de mais nada.
Acordei deitado numa cama e a ver tudo branco à minha volta.
O tipo que se debruçou sobre mim também estava vestido de branco.
Vi logo que não estava no céu pois não tinha visto aquela luzinha que alguns privilegiados dizem que vêem quando voltam para trás a meio da viagem.
- Mas como é que eu vim aqui parar? – Perguntei.
- Onde é que eu estou?
- Tenha calma, está tudo sob controlo. Está no hospital do Telhal.
Pronto, pensei eu antes de me passar outra vez, chegou o dia há tanto tempo anunciado:
Os malucos estão a meter todos os racionais no manicómio.
A.M.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Vai chover ferro!

Eles dizem que vai cair do céu uma máquina que andava a palpitar sobre os buracos do ozónio e de forma algo incontrolável. Dizem que a queda se vai dar no dia 26 deste mês de setembro que, embora já não tenha grande significado para mim, é o dia mundial da contraceção, celebrado por uns e estigmatizado por outros.

O jornal informava, suponho que para nos acalmar, que a possibilidade de alguém levar com ele na tola era de 1 em 3.200, ou seja 0,05 por cento. Claro que se vai desintegrar e se as peças maiores podem matar alguém, as porcas e os parafusos vão certamente fazer alguns galos.
Perante esta percentagem pus-me a pensar como é possível que os ativos apostadores do “euro milhões”, se arrisquem a sair à rua nesse dia. Sim, porque têm incomensuravelmente mais possibilidades de levarem com uma peça (ver fotografia) no toutiço do que serem premiados naquele jogo.
Eu vou sair, mas por causa do azar que há anos não me larga, vou levar na cabeça um velho capacete da primeira grande guerra que um meu antepassado me ofereceu há muitos anos.
A máscara de gás é que já se estragou.
A.M.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Conversa fiada

A notícia:


Patrões não aceitam que trabalhadores levem fundo se saírem.
Só não me escangalhei todo a rir porque o caso não é para brincadeiras.
O assunto é sério e merece reflexão.
1 – Mesmo que os patrões aceitem sem reservas pagar 1% sobre o salário e diuturnidades dos trabalhadores ao seu serviço, essa despesa passará a fazer parte do custo final do produto. Mais tarde ou mais cedo o empresário será ressarcido: Condicionando o salário do seu empregado em ajustes futuros, aumentando o preço do produto final, ou as duas coisas ao mesmo tempo.
2 – Mas a parte caricatural pode resumir-se à resposta a esta pergunta:
Qual o número de trabalhadores despedidos por ano e qual o número dos que se despedem?
No contexto económico em que nos encontramos, com mais de 600 mil desempregados quantos trabalhadores se despediram das suas empresas?
Todos? Metade? Dez por cento? Talvez nem um por cento.
Ora informem-nos lá desse número, já que têm sempre as estatísticas em dia.
Nesse altura todo o país vai rir a bandeiras despregadas!


Nota: Segue o meu pedido de desculpas ao cartonista Nani que em "Vereda" produz os seus sugestivos "bonecos".
A.M.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Involução

Crise leva empresas a adiantar salários e a conceder empréstimos a trabalhadores – a notícia.
Aparentemente trata-se de um acto humanitário.
Quem terá coragem de criticar tal atitude quando ela se destina a ajudar um chefe de família que já perdeu o crédito no talho e na mercearia?
Ninguém. Nem eu tão pouco.
Contudo não posso deixar de me emocionar com situações como esta.
Emocionar e revoltar.
Vendidos ao desbarato alguns bens acumulados e empenhados os anéis, o relógio de cuco e os brincos que oferecera à mulher num dia de aniversário, o trabalhador vê-se, por fim, obrigado a empenhar a única coisa que lhe resta: A FORÇA DE TRABALHO.
Talvez nunca mais se possa desempenhar e fique toda a vida amarrado para pagar com juros tal empréstimo.

sábado, 3 de setembro de 2011

Silogismo

O Américo afinou.
- Rico? Eu? Homessa, sou um trabalhador.
Destas palavras e sem grandes cogitações pode formar-se um silogismo que vou cuidar de saber mais tarde se é falso ou verdadeiro.
Américo não gosta de ser rico. (premissa 1)
Gosta de ser conhecido como trabalhador. (premissa 2)
Logo, não se pode ser simultaneamente rico e trabalhador. (conclusão)
Ouvi dizer, ou se calhar sonhei que Américo, irritadíssimo com a classificação que lhe foi atribuída pela “Forbes” resolveu processar o director da mesma.
O advogado que o representa defenderá a teoria de que comparado com Bill Gates que tem 53 mil milhões de dólares, o Américo é um pobre trabalhador.
Caro Américo, só espero que daqui a dois anos, quando tiver a tua idade, não fique com a mania que sou rico e me zangue quando me chamarem trabalhador.
Se isso acontecer é porque estou gagá.
Cada um sabe de si… alguns momentos antes de se chegar a esse patamar.
A.M.